Julgava que o Luxemburgo estava reservado a presos políticos. E não a pobres moças do campo, injustamente acusadas de roubarem uma coisa – Sei lá o quê!
O texto seguinte pode conter spoilers do livro “Fábulas e Reflexões”, sexto volume da série Sandman (Formato BD)
Fábulas e Reflexões inclui os números originais 29 a 31, 38 a 40 e 50 da Sandman de Neil Gaiman, publicadas entre 1991 e 1992 pela DC/ Vertigo. Em Portugal, a coleção está nos escaparates por conta da colaboração Levoir/ Jornal Público.
Dividido em oito histórias, Fábulas e Reflexões conta com a ilustração de Bryan Talbot, Stan Woch, Shawn McManus, Collen Doran, Jill Thompson. Medo de Cair é um preview da Vertigo. História muito curta com uma mensagem filosofal, apresenta Sonho como uma nota introdutória.

Agosto passa-se no Império Romano, onde acompanhamos um dia da vida do cansado e perturbado Imperador Caius Octavius. Apesar de ser a figura principal da narrativa, é o irreverente anão Lycius quem conta a história.
Seguindo o mesmo padrão, Termidor foca-se em Robespierre, um dos principais responsáveis pela Revolução Francesa. Passa-se na França de 1794, a sofrer as consequências do banho de sangue que se seguiu ao conflito. Depois do encontro na short story Homens de Boa Fortuna, Sonho volta a encontrar Johanna Constantine, a antepassada de John Constantine. É através dela que a história nos é apresentada, quando Sonho a contacta para guardar a cabeça do seu filho Orfeu. As coisas complicam-se quando a cabeça – falante, por sinal – é cobiçada pelo próprio Robespierre.
Três Setembros e um Janeiro, título inspirado no filme Quatro Casamentos e um Funeral, é focado em Joshua Abraham Norton, um personagem verídico que passa de um pobre miserável a Imperador dos Estados Unidos. Claro está, não escapa incólume à disputa dos Eternos.

Em A Caçada, um avô conta à neta uma história antiga do seu povo, quando a família ainda não tinha emigrado. Nessa história, Vassili procura desesperadamente a filha de um conde. Para isso, invade o mundo do Sonho após negociar com Lucien, e indaga Morfeu sobre a localização da mulher. No entanto, Vassili só viria a encontrar a felicidade sob a forma de um animal.
Regiões Abstratas apresenta o diálogo entre o jovem explorador Marco Polo e o seu futuro biógrafo. Com Gengis Khan a surgir em relatos, a história confunde-se em termos de linha temporal, dependendo da perspetiva do personagem. Marco Polo encontra Morfeu no deserto, mostrando-nos como o tempo fluí de modo diferente no domínio do Sonho, e onde os lugares podem ser bem distintos e abstratos.
A Canção de Orfeu é um apêndice que recupera a lenda clássica de Orfeu, introduzindo Orfeu e Eurídice no universo Sandman. Foi nesta short story que Orfeu foi apresentado como filho de Morfeu e da musa Calíope. O Parlamento das Gralhas é, possivelmente, a história mais importante do volume. Daniel, o filho de Lyta Hall apresentado no volume Casa de Bonecas, faz a sua primeira visita ao domínio do Sonho. Para além de revelar que Daniel herdou alguns poderes dos Eternos, esta história mostra também que Caim, Abel e Eva estiveram presentes durante a infância destes, deixando adivinhar que muitos dos eventos bíblicos ocorreram naquele patamar.

SINOPSE:
Dividido em 8 contos fantásticos, todos eles fechados, este volume põe o leitor a sonhar de olhos bem abertos. Nele, o Senhor dos Sonhos dá-nos a conhecer os segredos que unem imperadores e actores, reis e demónios, divindades e seres da natureza, lobisomens e corvos. O sonho trágico de Orfeu é-nos revelado, mostrando como a relação entre pai e filho ficou para sempre marcada, e esta é uma das principais histórias da saga, que terá profundas consequências mais para a frente.
A intertextualidade é marcante em ‘Fábulas e Reflexões’, que reúne personagens de outras eras, de lugares e realidades diferentes. O resultado são histórias que não mais esquecerá, sobre sonhos de amor e de vida, de poder e escuridão.
Por questões de organização de volumes da colecção, a história ‘Ramadão’, geralmente incluída neste volume na versão original, será editada no volume 8 da colecção, ‘A Estalagem no Fim do Mundo’; esta alteração não tem qualquer impacto na leitura da saga completa, tratando-se de uma história curta, separada da cronologia da narrativa central.
OPINIÃO:
Apesar de dividido em contos, Fábulas e Reflexões acabou por aproximar-se da narrativa central de Sandman: Mestre dos Sonhos e recuperou alguns personagens deixados anteriormente ao abandono. Paralelamente a isso, todas as histórias tiveram algo para contar, sendo aquelas que mais se destacaram, na minha opinião, A Canção de Orfeu, Agosto e O Parlamento das Gralhas, embora todas me tenham agradado no seu todo.
A simbologia continua a ser tecida por Neil Gaiman nas entrelinhas, com Sandman a ganhar cada vez mais um significado metafórico. A ação, por sua vez, continua intermitente, sem um fio condutor estável. Os episódios são alternados, podendo ser recuperados aqui e ali, sem um propósito claro. É, nitidamente, a acusação mais negativa à obra; Sandman aposta na extrapolação de referências, significâncias e pensamentos filosóficos, negligenciando uma linha de ação coerente.

A nível gráfico, a arte de McManus, Talbot, Doran e companhia manteve a mesma toada dos antecessores. Todas as histórias estiveram bem representadas, apresentando mensagens detalhadas e coloridas, contrastando com o sombrio que enevoa os Eternos.
Avaliação: 7/10
Sandman: Mestre dos Sonhos (Levoir/Público):
#6 Fábulas e Reflexões
#7 Vidas Breves
#8 A Estalagem no Fim do Mundo
#11 A Vigília
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