Lolita, brilho da minha vida, fogo dos meus flancos. Minha alma, minha lama. Lo‑lii‑ta: a ponta da língua enrola no palato e desliza, três socalcos, até que estaca, ao terceiro, nos dentes. Lo. Li. Ta.
ESTE TEXTO ABORDA O LIVRO LOLITA
Vladimir Nabokov foi um autor norte-americano de origem russa, um dos mais célebres autores do séc. XX. Foi durante o seu exílio na Alemanha que escreveu, em russo, a primeira parte da sua obra literária, de entre a qual se destaca Mashenka e Glória. Nos anos 40 adquiriu a nacionalidade americana ao radicar-se nos E.U.A. e ali começou a escrever em inglês, sempre com um elevado grau de ironia e crítica para com a sociedade da época.
Algumas das suas obras mais marcantes são Invitation to a Beheading, The Real Life of Sebastian Knight e Lolita. Este último tornou-se um grande êxito editorial que acabou adaptado para o cinema por Stanley Kubrick em 62, cujo argumento se baseia nos amores de um homem adulto por uma adolescente. Em Portugal chegou-me a edição da Relógio D’Água de 2013, com um total de 360 páginas e tradução de Margarida Vale de Gato.

Nunca vi nenhuma das adaptações ao cinema de Lolita, mas sabia mais ou menos ao que ia quando peguei no livro. E as expectativas eram altas, ou não me tivesse sido bem recomendado. Ao passar as primeiras folhas, fiquei deliciado com a escrita de Vladimir Nabokov, mas rapidamente a prosa, bem embebida na mente retorcida de um narrador pouco confiável e realmente abjeto, acabou por se tornar para mim intragável.
“Mesmo analisando a arte pela arte, não conseguirei nunca gostar de algo que me dá vómitos.“
É um livro que se tornou um clássico da literatura e mesmo quem nunca ouviu falar no autor certamente que já ouviu falar do livro. Até mesmo o termo lolita acabou por se tornar na cultura popular sinónimo de um comportamento precoce para uma jovem adolescente. É uma narrativa que, mesmo sendo o retrato de um pedófilo na primeira pessoa, podia ter-me conquistado.

Não o fez e não culpo diretamente o narrador por isso. Excessivamente preocupado em mostrar os seus dotes como escritor, Nabokov acabou por contar a história de uma personagem que andou ali à procura do mesmo do princípio ao fim. A narrativa é repetitiva e perdeu-se várias vezes com detalhes desnecessários e sem conteúdo, tornando a leitura cansativa.
As descrições mais “eróticas” muito pouco tiveram de belo, deixando-me mais com um trago a azedo na boca do que com vontade em continuar a ler. Pode-se até alegar que era provocar esse desconforto a intenção do autor. Tudo bem, mas isso não oferece mais qualidade ao livro. Neste caso, não ofereceu.

Humbert Humbert é o pseudónimo do protagonista narrador deste livro, que conhecemos através dos seus relatos escritos numa espécie de diário que pretende publicar, e que é de certa forma romanceado para não tornar menos chocante o seu apetite por meninas de doze anos. O que não consegue com facilidade. O protagonista mostra-se desde o primeiro momento obcecado por Dolores Haze, uma menina com quem se envolve sexualmente após se tornar seu padrasto e a quem chama “carinhosamente” de Lolita.
A mãos com o relato de uma relação doentia, Nabokov tem mérito em conseguir descrever bem a sociedade da época, mas o discurso repetitivo do protagonista, o seu fascínio absurdo por (várias) crianças e as fantasias que o autor se esforçou para que parecessem ao mesmo tempo poéticas e viscerais, são componentes que não deixam de ser perturbadoras e nojentas. Mesmo analisando a arte pela arte, não conseguirei nunca gostar de algo que me dá vómitos.
Avaliação: 3/10
3 comentários em “Estive a Ler: Lolita”