O Cogumelo conta uma história muito diferente. Na sua versão, foi a Princesa Rhaenyra que foi ter com Sor Criston, não ele com ela. Encontrou-o sozinho na Torre da Espada Branca, trancou a porta e despiu o manto para se revelar nua por baixo.
O TEXTO SEGUINTE ABORDA OS LIVROS SANGUE E FOGO VOL. 1 PARTE 1 E SANGUE E FOGO VOL. 1 PARTE 2
Dragões e mais dragões! Dividido em dois volumes, Fire & Blood é a obra de George R. R. Martin sobre a História dos Reis Targaryen, figuras de proa das Crónicas de Gelo e Fogo. Apenas o primeiro volume foi publicado e desde logo dividido no nosso país em dois, a primeira parte lançada quase em simultâneo com o original, pelo que se espera ter quatro livros em Portugal a explicar as vivências dos Targaryen e as ramificações da genealogia de personagens capitais das famosas Crónicas.
Os quatro volumes chamar-se-ão Sangue e Fogo, apesar de terem como título de série A História dos Reis Targaryen, que prefiro interpretar como subtítulo. Os livros, como todos os de George R. R. Martin publicados pela Saída de Emergência, têm tradução de Jorge Candeias. O primeiro conta com 352 páginas e o segundo com 400, ambos com lindíssimas ilustrações de Doug Wheatley, mais de oitenta imagens a preto e branco que retratam de forma verosímil as personagens fictícias dos livros.
Contado de uma forma distante, quase enciclopédica, o primeiro volume original de Fire & Blood consegue, de forma imprevisível, captar a atenção do leitor para as vivências e vicissitudes da vida dos Targaryen, desde a sua chegada a Westeros. Os dilemas amorosos, as desavenças familiares, os partidos políticos e as intrigas palacianas são apresentadas de forma concisa. Mas mesmo através dos olhos de um meistre que nunca viveu aquilo e que apenas se pode apoiar nos relatos dos seus antecessores, os acontecimentos parecem palpáveis e dignos de nota.
“Sangue e Fogo é uma ótima forma de matar saudades deste mundo tão rico e cheio de surpresas.“
Fire & Blood é o lema da Casa Targaryen, família real quase extinta nas famosas Crónicas de Gelo e Fogo de George R. R. Martin, mas também o nome da compilação sobre a História da famosa família desde que Aegon I, O Conquistador, pousou em Westeros no dorso do seu dragão Balerion, até à sua queda com o regicídio de Aerys II, O Rei Louco, em 281 DC. Trata-se de um relato fictício com base em relatos de notáveis das épocas em causa, que oferece uma panorâmica interessante sobre os Targaryen e as suas vivências, ainda que em muitos momentos mesmo o narrador defenda a incongruência ou pouca crença em certos relatos.
Acompanhadas por frequentes notas de rodapé e curiosidades lascivas da vida na corte, as duas partes deste primeiro volume revelam consistência e sabem espicaçar a fome do leitor em saber mais sobre este, aquele e aqueloutro, conseguindo não se perder por demasiado tempo em devaneios e conseguindo amarrar as várias pontas que por aqui e ali se vão desdobrando. George R. R. Martin é um contador de histórias por excelência, e apesar de, na minha perspetiva, Sangue e Fogo ficar aquém das Crónicas de Gelo e Fogo base, tal deve-se propriamente à proposta e à forma, e não à qualidade do mesmo.
Sangue e Fogo é chamado O Silmarillion das Crónicas, por ter uma estrutura algo semelhante à obra de J. R. R. Tolkien, tanto no estilo de prosa como na relação de passado histórico para com a série principal dos dois autores. E não posso dizer que tenha gostado de O Silmarillion, pelo que a expectativa de gostar de Sangue e Fogo não seria tão grande. Mas é muito difícil reprovar algo que George R. R. Martin escreva. Li este novo livro e gostei bastante.
A primeira parte, com a capa vermelha, começa com o reino de Aegon I Targaryen e a forma como ele conseguiu conquistar seis dos Sete Reinos, com a excepção de Dorne. Mas os relatos sobre as suas conquistas, a sua vida com as irmãs e esposas, Rhaenys e Visenya, ou mesmo a sua relação com os dragões, não se expande por aí além. Vemos a fundação de Porto Real e a criação do Trono de Ferro, e pouco mais há a saber. Desde logo conhecemos os filhos de Aegon, irmãos e primos, Aenys I e Maegor, O Cruel, que viriam a odiar-se.
“Porque sim, sangue e cabeças decepadas é o que não faltam neste livro.“
No que diz respeito a estes dois, Martin oferece mais pormenores e a questão da sucessão começa a ser explorada com mais veemência. Ambos reinaram e foram coroados, mas não se pode dizer que tenham sido amados. É em Jaehaerys I e na sua irmã-esposa, a Boa Rainha Alysanne, que esta primeira parte se concentra, e é deles a grande maioria do livro. Filho de Aenys, Jaehaerys foi um rei amado e glorificado, unindo os Sete Reinos, fundando a Estrada do Rei e governando por cinquenta e cinco anos, o período mais estável e próspero da dinastia Targaryen. Mas foram muitos os dissabores e incidentes que se deram nesse período, ou Martin não gastaria tantas páginas dedicadas a ele.
A segunda parte, com a capa negra, inicia-se com a morte de Alysanne e de Jaehaerys, e a sua sucessão por Viserys I Targaryen, o seu neto, depois de o rei ver morrer antes de si todos os filhos homens e um conselho decretar que devia ser a parte masculina do seu sangue a herdar a coroa. Viserys foi um rei manifestamente inferior ao avô, e no seu reinado pouco há a destacar, para além do seu casamento com Alicent Hightower e da rivalidade desta para com a filha do primeiro matrimónio do rei, Rhaenyra, que viria a criar raízes para uma grande guerra.
É aqui que conhecemos a chamada Dança dos Dragões, que se deu após a morte de Viserys, uma luta pelo trono entre Rhaenyra e o filho de Viserys com Alicent, Aegon II Targaryen. Aegon reina por dois anos, sempre com a meia-irmã nos calcanhares. Durante esta guerra pelo Trono de Ferro, morreram muitas das grandes personalidades de então e poucos foram os dragões que lhe sobreviveram. Viria a ser o filho de Rhaenyra com o seu tio e esposo Daemon Targaryen, Aegon III, a herdar a coroa, e o que resta deste livro conta o período em que até os Stark detiveram um certo poder sobre Porto Real e homens ardilosos calçaram as luvas da regência, até o jovem rei alcançar a maioridade.
Sangue e Fogo surpreendeu-me favoravelmente. Claro que há várias passagens em que desejamos que o autor desenrole e nos diga o que é que aconteceu com as personagens e como é que eles morrem, há momentos em que George R. R. Martin pura e simplesmente parece ater-se a pormenores sórdidos de pouca monta, mas são mesmo esses momentos que nos fazem sentir a adrenalina e a descompressão quando a trama se desdobra toda de um momento para o outro e cabeças rolam por todos os lados. Porque sim, sangue e cabeças decepadas é o que não faltam neste livro.
A criação desta obra deu-se às custas do imenso material desenvolvido para o tomo O Mundo de Gelo e Fogo que não foi aproveitado, e desde então surgiu a ideia para um livro dedicado aos Targaryen, que se tornou tão grande que Martin viu-se obrigado a dividi-lo em dois volumes. Preferia que o bom velhinho nos trouxesse à luz do dia o tão aguardado Ventos do Inverno, mas sabemos que ele está a trabalhar afincadamente nele e este Sangue e Fogo é uma ótima forma de matar saudades deste mundo tão rico e cheio de surpresas.
Estes livros foram cedidos em parceria com a editora Saída de Emergência. Compra-os aqui e aqui.
Avaliação: 8/10
Sangue e Fogo – A História dos Reis Targaryen (Saída de Emergência):
#1 Volume 1 Parte 1
#2 Volume 1 Parte 2
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