Sempre há outro segredo. Palavras de Kelsier.
O texto seguinte pode conter spoilers do livro “O Poço da Ascensão”, segundo volume da trilogia Mistborn – Nascida das Brumas
Mistborn é uma das sagas mais prestigiadas do autor Brandon Sanderson, um mundo fortíssimo que caiu como uma lufada de ar fresco no panorama fantástico nacional com O Império Final, primeiro volume da trilogia. A ideia não é nova: uma menina frágil e desprotegida que se vê arrastada para uma demanda heróica na defesa dos pobres e oprimidos contra um tirano déspota que se assumiu como imperador e deus: O Senhor Soberano, que governa há mil anos o Império Final. Desde a sua Ascensão, os dias ficaram cheios de cinza, as noites cheias de bruma, e é na bruma que os nascidos das brumas mostram o seu poder.
No primeiro volume somos apresentados a Kelsier, um excêntrico anti-herói que se assume como líder da rebelião dos escravos skaa contra o Senhor Soberano, e para o parar convoca um grupo de homens de boa índole, dotados na arte da alomância – uma magia hereditária muito peculiar que consiste na ingestão de metais. Entre esses homens, ao mesmo tempo tão díspares e tão iguais, encontra-se Vin, a menina que se vem a descobrir uma nascida das brumas. Ela aprende a lidar nessa arte mágica com Kelsier e, mais do que isso, aprende as regras da amizade e da confiança.
No final do primeiro volume, Kelsier sacrifica-se, tornando-se um novo deus para a população skaa, enquanto Vin enfrenta o Senhor Soberano e, descobrindo os seus pontos fracos, mata-o. No entanto, as últimas palavras do Senhor Soberano são lúgubres, e deixam antever que matá-lo fora um erro grosseiro que poderá custar o mundo que eles conhecem.

Com a capitulação do deus-imperador, Elend Venture, um dos poucos nobres que não fugiu à rebelião, torna-se rei de Luthadel, e ao lado de Vin vê-se com a tarefa difícil de gerir o legado do Senhor Soberano e as defesas da cidade. É sobre essa gestão que se foca este segundo volume. A gestão pessoal e profissional de um reino, e os celeumas que uma governação frágil despertam numa assembleia de largos poderes.
O antigo bando de Kelsier ocupou posições de destaque no governo de Elend, Vin tornou-se um ícone religioso para a população e três exércitos temíveis montam cerco à cidade. Mas tudo isso é de pouca importância quando um poder ilimitado pulsa na cidade. Onde estará o Poço da Ascensão que transformou um simples carregador terrisano no Senhor Soberano? Que baques são aqueles que Vin ouve cada vez com mais frequência? Coisas estranhas movem-se na bruma, que cai com cada vez mais abundância, e pessoas começam a morrer.

SINOPSE:
Alcançaram o impossível: o mal que governara o mundo pela força do terror foi derrotado. Mas alguns dos heróis que lideraram esse triunfo não sobreviveram, e eis que surge uma nova tarefa de proporções igualmente gigantescas: reconstruir um novo mundo. Vin é agora a mais talentosa na arte e técnica da Alomância e decide reunir forças com os outros membros do bando de Kelsier para ascender das ruínas de um passado vil.
Venerada ou perseguida, Vin sente-se desconfortável com o peso que carrega sobre os ombros. A cidade de Luthadel não se governa sozinha, e Vin e os outros membros do bando de Kelsier aprendem estratégia e diplomacia política enquanto lidam com invasões iminentes à cidade.
Enquanto o cerco a Luthadel se torna cada vez mais apertado, uma lenda antiga parece oferecer um brilho de esperança: o Poço da Ascensão. Mas mesmo que exista, ninguém sabe onde se encontra nem o poder que contém… Resta a Vin e aos seus amigos agarrar esta fonte de esperança e conseguir garantir o seu futuro e futuro de Luthadel, cumprindo os seus sonhos e os sonhos de Kelsier.
OPINIÃO:
Há autores que nos agarram desde o primeiro instante, por uma ou outra razão em peculiar. Não foi o que sucedeu comigo; estive mais de um ano a esgatanhar um excerto do prólogo de O Império Final e a não gostar da escrita de Brandon Sanderson… até alguém me oferecer o livro. De facto, a escrita do autor é bastante competente, mas um pouco repetitiva. No entanto, se falta alguma maturidade literária ao escritor, não posso dizer o mesmo em termos de conteúdo.
Não tenho como dizer que este segundo livro é melhor que o primeiro – na minha opinião, não é melhor. Nenhum dos personagens apresentados neste segundo capítulo ombreia com o fantástico Kelsier, com os seus ditos de espírito e aparente descontração quando todo o mundo desmorona à sua volta. Mas as ressonâncias da sua própria existência estão por toda a parte neste Poço da Ascensão.
Se O Império Final nos conquista pelo clima de rebelião e esperança, pelos ensinamentos que Kelsier nos incute, por todo o mundo novo que Sanderson nos apresenta, pela questão da alomância, pelos Inquisidores de Aço e pela profecia do Herói das Eras, O Poço da Ascensão conquistou-me por um motivo completamente diferente. Os debates. Este livro é muito mais que um livro de fantasia. É um debate sobre religião, sobre política, sobre relações. Um debate tão contumaz como O Príncipe de Maquiavel, sem deixar de ter um enredo paralelo repleto de ação e acontecimentos que se sucedem uns após os outros.

À primeira vista, somos chamados para um cenário ao estilo Duna ou Crónicas de Riddick, embora os seus personagens tenham algo de Disney no seu design. Acrescentando-lhe o sumo de uma complexidade interior notável, presente em cada personagem, e um background original em fantasia, Brandon Sanderson criou aqui uma obra que não pode ser deixada de lado.
Neste volume, Vin cativou-me mais do que no primeiro livro, principalmente desde que deixou de lado os seus pensamentos imbecis; de facto Sanderson mostra através desta personagem que devemos confiar mais nos nossos sentimentos, e que por vezes estragamos tudo por pensar demais nas coisas e duvidar delas. Ainda assim, Vin não está no meu lote de personagens preferidos. Sazed foi um dos personagens que menos gostei em O Império Final e os primeiros capítulos dele neste volume foram um suplício. Via-o como um aborrecimento de personagem. No entanto, a sua evolução ao longo do livro fez-me admirá-lo profusamente.

Zane foi um personagem bastante interessante; o seu tempo de antena foi curto, mas em abono da verdade acho que desapareceu no timing certo. Começava a tornar-se sufocante o ódio que ele despertava em mim como leitor. Percebi também a função de Tindwyl na trama, mas pessoalmente não acrescentou em nada, assim como Allrianne. Os vilões pareceram, todos eles, mais frágeis do que seria suposto, e vejo nisso uma crítica, seria mais interessante que fossem menos e melhor construídos.
O meu grande elogio vai para o bando do Kelsier. Continuou tão genial como no primeiro volume, e não gostei que o autor tenha morto alguns deles, sem sequer mostrar como isso ocorreu. E claro, adorei Elend Venture, que se tornou o meu personagem preferido e com quem mais me identifico. Se no primeiro volume, ele foi um personagem secundário, neste volume ele carregou o livro em ombros. Através dele, vimos o fim de um rapaz e o princípio de um rei, com tudo o que isso implica na modelagem de um indivíduo.

Nem tudo foram rosas. Se no primeiro volume critiquei vivamente as lacunas na construção do mundo, a nível cultural, tecnológico e as questões naturais, neste segundo livro sinto que Sanderson se revelou um autor maduro a nível de construção de seres humanos e das suas dicotomias interiores, mas fraquejou um pouco na construção de uma história minimamente credível. A forma como Lekal passou de um jovem académico a precário déspota, em apenas um ano, a forma como ele ludibriou os colossos e a própria conjuntura física desses monstros, pareceram-me errados.
A parte estratégica do cerco foi bem pensada e as batalhas finais muito bem descritas, mas em vários momentos as movimentações pareceram forçadas, as atitudes dos líderes inimigos um pouco imaturas e desesperadas, e claro, apesar de gostar de ver um cavalo cortado ao meio, a forma como Vin voou e matou aquele personagem pareceu-me extremamente irreal. Também senti alguma confusão do autor no momento em que explicou a forma como domar os kandra e mais tarde, a explicar a essência do Poço da Ascensão e o papel do espírito de brumas. No final penso que percebi, mas o autor podia ter sido mais explícito quando assim se exigia.
Fica agora a vontade de terminar esta trilogia. Brandon Sanderson consegue chegar-nos à alma com a profundeza dos seus personagens, para além das questões políticas e religiosas arraigadas ao background do mundo fantástico, que são excelentes. Foi um livro cheio de mortes importantes, talvez demasiadas, mas em guerras é muito provável que tal aconteça. Foi uma história que se mastigou bastante durante algum tempo – podia ser contada em muito menos páginas, mas aceito a opção do autor -, e é uma escrita que não me encanta minimamente, mas por tudo o que citei nesta opinião, está mais do que recomendado a todos os fãs de fantástico.
Avaliação: 7/10
Cosmere:
The Stormlight Archive (Tor Books):
#2.5 Edgedancer
#3 Oathbringer
#4 Rythm of War
Mistborn Era 1 (Saída de Emergência):
#2 O Poço da Ascensão
Mistborn Era 2 (Leya):
Mistborn (Tor Books):
Warbreaker:
#1 Warbreaker
White Sand (Dynamite):
Elantris (Leya):
#1 Elantris
Mulheres Perigosas (Saída de Emergência)
#* Sombras Para Silêncio nas Florestas do Inferno
(*) conto incluído em antologia
Olá!
Gostei imenso da tua opinião. Vai ao encontro de muito do que eu acho deste autor e da sua obra. A parte da Vin ter deixado de ter os seus pensamentos imbecis, como referes, está excelente! Porque eu achei o mesmo, o primeiro livro perdeu muito por causa dela e dos seus pensamentos.
Também gostei do facto de teres colocado a imagem com os desenhos das personagens. Ajuda bastante a nível visual e de imaginação.
Considero que a história é boa, o enredo e as personagens, mas também acho que o autor não soube aproveitar todo o potencial que imaginou. Acho que não conseguiu passar para o papel toda a sua imaginação. De todos os três que li até ao momento, O Poço da Ascensão foi o que mais gostei.
Bjs e boas leituras
Olá, Lamora 😀
Nesse sentido estamos de acordo, a Vin foi mesmo uma parvinha, com tantas dúvidas, mas faz parte do ser humano ter dúvidas, dilemas e fraquezas. Não acho que o autor tenha estado mal e isso só me fez odiar ainda mais o Zane pela influência que teve nela xD Eu gostei mais do primeiro livro, por um lado por que estava à espera que fosse mauzinho, por outro porque este segundo, apesar de todas as questões que enalteci na opinião, tornou-se um pouco cliché e irreal na forma com que a Vin derrotou tudo o que era inimigo. Parecia o super-homem :p
Percebo o que dizes no que diz respeito ao autor não passar para o papel tudo o que imaginou, e isso é visível, por exemplo, no caso do Zane ou do Straff, que tinham tudo para ser antagonistas de grande importância e acabaram por ter grande desenvolvimento para uma participação reduzida.
Beijinho e obrigado pela opinião. 🙂
Olá Nuno. Ainda nao comprei o teu livro mas está na minha minha wish list. Quando vieres a Coimbra ou Porto trás um livro para mo autografares.
Quanto ao 1º livro da saga Mistborn eu já li e não gostei. Acho uma perfeita seca aquela cena de engolir metais e voar entre outras coisas. É uma ideia nova mas que não me seduziu minimamente. É fantasia sim, mas sem grande força. Mesmo toda a historia a volta do bando e do déspota da história nunca me conseguiu apanhar. Para mim foi uma desilusão.
Mas… sei que a critica internacional especializada põe o Sanderson nos píncaros dizendo que esta série já é uma das melhores de sempre e que ele é brilhante. Foi inclusivamente Brandon o escritor escolhido para dar continuidade à saga “A Roda do Tempo” (comprei o 1º livro, não é mau, é mais uma demanda) quando o autor Robert Jordan morreu. Se os especialistas dizem que ele é muito bom… quem sou eu para dizer o contrário. Gostei muito da escrita dele, mas a trama nao me seduziu minimamente. Mas isto prende-se apenas com o meu gosto pessoal e não com a qualidade do senhor.
Abraço
Olá Jota Pê. Fico contente que o meu livro esteja na tua wish list, quem saiba to possa autografar pessoalmente. Quanto a Mistborn, estou longe de a pôr nos píncaros ou achar que é das melhores de sempre, mas tendo em conta o que tem sido publicado em Portugal, está a surpreender-me pela positiva. A escrita do Sanderson é fluída, mas acho-a pobre e por vezes repetitiva. O grande trunfo do autor, para além do background, que inclui, claro, o sistema de magias, é a profundidade que conferiu aos personagens. 🙂 Abraço.
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Viva,
Gostei muito de teu comentário foca muito bem as partes que mais te agradaram e as que menos gostaste e estamos de acordo, então quando afirmas que não é Martin nem Lynch mais do que de acordo 🙂
Ainda assim lê-se bem, para mim a grande falha é mesmo nos elementos fantásticos, tem coisas bem pensada mas a cena de voarem e Vin derrotar um exercito bem que exagero 😀
Abraço do Fiacha (caso fique anonimo 😛 )
Por acaso desta vez não ficou anónimo :p
Bem, estamos mesmo de acordo na opinião a este livro. É verdade, estou a gostar de ler Sanderson, mas nem chega perto desses génios (Martin e Lynch). Mas para mim, mesmo assim, continua a despertar-me mais interesse do que Robin Hobb e Guy Gavriel Kay, que sei que para ti são melhores 😀
Obrigado pelo comentário e grande abraço.
Ai rapaz até estávamos de acordo ai ai, a Robin Hobb é uma maravilha e o Guy Gavriel Kay adoro o livro Os Leões de Al Rassan mas é algo diferente aqui do nosso amigo Sanderson 😛
Ahahah eu sei que nesse ponto já não estamos de acordo. 😛 Claro que tanto a Hobb como o Kay escrevem melhor que o Sanderson, e até são mais credíveis, não consigo é ter interesse ou entusiasmo com as suas histórias, o que este me oferece 😀 😀
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